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Um pouco de poesia

Buçaco3

A poesia está guardada nas palavras — é tudo que eu sei.
Meu fado é o de não saber quase tudo.
Sobre o nada eu tenho profundidades.
Não tenho conexões com a realidade.
Poderoso para mim não é aquele que descobre ouro.
Para mim poderoso é aquele que descobre as insignificâncias (do mundo e as nossas).
Por essa pequena sentença me elogiaram de imbecil.
Fiquei emocionado.
Sou fraco para elogios.

Manoel de Barros, Tratado geral das grandezas do ínfimo

Muito mais do que um poema, uma paixão

butterfliesAcho que já deixei bem evidente neste blog o quanto amo poesia, já o afirmei de várias formas e não há qualquer dúvida de que a maioria das minhas publicações são poemas de vários autores e até já tentei fazer alguns rascunhos de possíveis poemas.

Como é óbvio, quando guardo aqui um poema, é porque gosto muito dele e tenho vontade de o reler e sentir de acordo com o meu estado de espírito do momento. Sim, porque não lemos o mesmo poema duas vezes da mesma maneira, nós estamos sempre a mudar… e logo a nossa maneira de sentir as palavras também muda. Reparem que mesmo quando lemos um poema uma segunda vez logo a seguir à primeira, já temos a experiência de uma primeira leitura e os sentimentos à flor da pele já são outros.

No facebook, faço parte de alguns grupos de poesia e acompanho as páginas de alguns escritores que aprecio, como Mia Couto. Hoje, encontrei um link na página deste escritor,  “Dez inesquecíveis poemas de Mia Couto” e aconteceu-me um poema, ou seja, apaixonei-me perdidamente por um destes dez poemas. Porquê este, entre dez, ditos inesquecíveis? Não sei explicar. Talvez porque a luz incidia sobre aquelas palavras com um brilho diferente ou então porque eram as palavras que eu precisava de ler naquele preciso segundo. Nada disso interessa, o que fica, é uma sensação sublime de paixão por algo… E não há nada melhor do que o sentimento arrebatador de nos apaixonarmos, independentemente do foco da nossa paixão… seja por palavras… seja por imagens… seja por música… seja por pessoas…

Aqui fica o poema de Mia Couto, que sinto como sendo também meu, que o assimilei profundamente, transformando-o numa parte das minhas emoções e dos meus pensamentos. Espero que o apreciem tanto como eu. Caso isso não aconteça, sugiro que leiam os outros nove e quem sabe não encontram aí o vosso momento de paixão poética.

MC

O Amor, Meu Amor

Nosso amor é impuro
como impura é a luz e a água
e tudo quanto nasce
e vive além do tempo.

Minhas pernas são água,
as tuas são luz
e dão a volta ao universo
quando se enlaçam
até se tornarem deserto e escuro.
E eu sofro de te abraçar
depois de te abraçar para não sofrer.

E toco-te
para deixares de ter corpo
e o meu corpo nasce
quando se extingue no teu.

E respiro em ti
para me sufocar
e espreito em tua claridade
para me cegar,
meu Sol vertido em Lua,
minha noite alvorecida.

Tu me bebes
e eu me converto na tua sede.
Meus lábios mordem,
meus dentes beijam,
minha pele te veste
e ficas ainda mais despida.

Pudesse eu ser tu
E em tua saudade ser a minha própria espera.

Mas eu deito-me em teu leito
Quando apenas queria dormir em ti.

E sonho-te
Quando ansiava ser um sonho teu.

E levito, voo de semente,
para em mim mesmo te plantar
menos que flor: simples perfume,
lembrança de pétala sem chão onde tombar.

Teus olhos inundando os meus
e a minha vida, já sem leito,
vai galgando margens
até tudo ser mar.
Esse mar que só há depois do mar.

Mia Couto, No livro “Idades cidades divindades”

Ser poesia

Catrin Welz-Stein

Catrin Welz-Stein

A poesia é um mundo transcendente de palavras que rimam com emoções, em que cada um entra usando a sua imaginação como chave de acesso.

Não sei que verbo escolher para definir o quanto gosto de poesia. Às vezes, acho que as palavras que existem não são suficientemente poderosas para conseguir expressar o  que sinto.

Após uma pesquisa no dicionário de sinónimos para a palavra gostar, cheguei à conclusão que adoro, aprecio e me deleito com a poesia.

É raro o dia em que não leio alguns poemas e quando não o faço fico com a sensação de que me falta fazer qualquer coisa importante.

É incrível como nos podemos simultâneamente encontrar e perder nos versos de um poema. Ao mesmo tempo que nos deparamos com sentimentos familiares, de tão usuais, tão nossos…, também descobrimos novas formas de sentir e de nos emocionarmos.

Há poemas que me maravilham com tanta intensidade que não me canso de os ler e reler muitas vezes, como se quisesse sugar toda a seu essência e transformar-me num dos seus versos.

Se voltasse a ser uma criança e me perguntassem o que queria ser quando fosse grande, eu responderia que queria ser poesia. Gostava que me lessem com arrebatado prazer, que me declamassem com verdadeiro e sentido entusiasmo e que descobrissem em mim sentimentos intensos, com capacidade de alimentar com ímpeto as fantasias mais vorazes.

MC

Não deixes…

walking in the field

Não deixes que termine o dia sem teres crescido um pouco,
sem teres sido feliz, sem teres aumentado os teus sonhos.
Não te deixes vencer pelo desalento.
Não permitas que alguém retire o direito de te expressares,
que é quase um dever.
Não abandones as ânsias de fazer da tua vida algo extraordinário.
Não deixes de acreditar que as palavras e a poesia podem mudar o mundo.
Aconteça o que acontecer a nossa essência ficará intacta.
Somos seres cheios de paixão.
A vida é deserto e oásis.
Derruba-nos, ensina-nos, converte-nos em protagonistas de nossa própria história.
Ainda que o vento sopre contra, a poderosa obra continua:
tu podes tocar uma estrofe.
Não deixes nunca de sonhar, porque os sonhos tornam o homem livre.

Walt Whitman

As possibilidades infinitas de um poema…

No poema perdi-te,
Vi-te morrer.
No poema
Continuei a fingir que não morremos nunca,
No poema desenhei-te,
Traço por traço,
Sombra por sombra.
No poema desenhaste-te,
Fizeste-te vivo em palavras.

No poema despedi-me
Sem dizer adeus
E deixei de dar nomes às coisas,
Na vida, na morte e no poema,
Esquecemos a forma
E lembramos apenas o sentido.

Sara Rodrigues da Costa

O amor, na perspetiva de poetas de 10 anos

 

O amor é vermelho como a cor do morango apaixonado.

Sabe a paixão, que anda a voar pelos ares.

Cheira a jardins recheados de rosas perfumadas.

O amor… parece uma poesia cheia de alegria.

O som deste sentimento são as badaladas do coração… quando te vejo…

O amor provoca em mim nós no estômago e uma grande dor no peito.

Começo a tremer e a estar um pouco envergonhada, mas tento ultrapassar.

O amor é fundamental, enche o nosso coração de um calor enorme…

Este poema foi o resultado de uma oficina de escrita criativa realizada hoje, numa aula de Língua Portuguesa, como forma de comemorar o Dia Mundial da Poesia.

Há palavras que nos beijam

Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca,
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.

Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto,
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.

De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas, inesperadas
Como a poesia ou o amor.

(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído,
No papel abandonado)
Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.

Alexandre O’Neill